Muito se falou e tem se falado sobre a morte dos cookies de terceiros, especialmente nos últimos meses. Como todo processo de luto, já passamos pelas fases iniciais: 1) começamos pela negação, desacreditando que os cookies de terceiros realmente deixariam de existir; 2) passamos pelo momento de raiva, percebendo todos os impactos nas nossas estratégias de marketing, nos custos, nas necessidades de mudanças; 3) enfrentamos a fase de barganha, tentando entender realmente os impactos e achar brechas para continuarmos a operar como sempre; 4) até encararmos a fase de depressão, voltando o olhar bastante para dentro das companhias, estudando e analisando caminhos, pedindo ajuda de parceiros e fornecedores, trabalhando em conscientização.
Mas parece que estamos com dificuldade de encarar a última fase: a aceitação. É ela que nos dá o pontapé para nos reorganizarmos e nos prepararmos de fato para continuar e transformar a partir daí. Segundo o IAB State of Data 2022, apesar de quase 60% dos líderes do setor esperarem que a mensuração de campanhas publicitárias seja afetada pela perda de cookies e identificadores de terceiros, 66% não ajustou suas estratégias de mensuração neste ano e 59% dos profissionais não ampliaram seus investimentos em dados primários.
Os principais argumentos desses líderes são de que as agências e parceiros de Adtech são os proprietários das soluções; de que o mercado ainda está mudando, então por quê já implementar algo que ainda está em movimento?; e por fim o ponto de que ainda não estão prontos para tomarem a decisão. Mas aqui é essencial relembrar a máxima de sempre: a importância de ter ownership sobre os seus dados – todo ciclo de vida e jornada desde a coleta, mensuração, gestão, ativação e monetização. Em uma realidade que está em constante mudança, é tão importante não terceirizar essas definições, muito menos a conscientização, atualização, o entendimento e por fim a decisão de fato.
E como parte desse processo de aceitação, sempre acreditei que encontrar caminhos e testar soluções para gerar um movimento de transformação – seja ele o resultado final ou pelo menos um pontapé inicial em direção ao caminho que queremos construir – é uma das melhores maneiras de reagir. Nesse sentido, é importante agir! Começando pela conscientização, pelo aprofundamento nos estudos e entendimento dos reais impactos nas suas estratégias, mas principalmente agindo para incorporar as adaptações necessárias.
Quais são soluções que irão privilegiar o uso de first party data e que podemos potencializar? Como nos adequamos às regulamentações e quais são as preocupações em relação à privacidade e segurança com os dados dos consumidores que precisamos ter e quais medidas precisamos tomar? Quais KPIs, dados, plataformas, parceiros, tecnologias, processos precisamos revisar e como podemos começar? Existe uma diversidade de caminhos que podemos seguir e enfoque que podemos dar, mas levando em consideração que cerca de até US$ 10 bilhões* de receita anual (do lado da venda) estão em risco quando falamos de endereçabilidade e a mensuração na compra programática de RTB aberto, soluções que tragam alternativas para esses dois aspectos valem um destaque no cenário atual.
Por isso, se você ainda não ouviu falar sobre data clean room, eu convido você para saber pelo menos o 5W2H (O quê?, Por quê?, Quem?, Quanto?, Como?, Quando?, Onde?) do assunto, e buscar esse movimento e partir para ação nesse contexto que pede por agilidade e assertividade nas decisões.
O quê? É um ambiente seguro e que respeita e atende totalmente às novas diretrizes de privacidade dos usuários, onde duas ou mais partes podem acessar e compartilhar um conjunto de dados combinados que envolvem dados sensíveis das companhias e de usuários, mas de maneira anonimizada e agregada, o que não permite exposição e/ou identificação de usuários.
Por quê? A solução surgiu antes mesmo do cenário de fim dos cookies de terceiros e regulamentações mais restritivas de privacidade, com origem muito mais baseada na necessidade de se criar um ambiente seguro e privado para enriquecimento de dados primários. No cenário atual, sua importância se faz ainda mais relevante e podemos citar alguns casos de uso: enriquecimento de perfis de clientes (players de streaming podendo segmentar melhor seus clientes com base em interesses e utilizando como insumos para maior assertividade em recomendações, criação de experiências e ofertas personalizadas), identificação de fraude de forma colaborativa entre empresas do setor financeiro, análises de sobreposição de audiências entre diferentes empresas como por exemplo setor hoteleiro e companhias aéreas, mensuração e atribuição de campanhas de maneira integral (por exemplo, um grande publisher colaborando com informações de usuários que interagiram ou foram impactados por determinados anúncios de marcas anunciantes).
Quem? Grandes players do mercado já possuem essa solução como aposta de tendência e caminho para mensuração e atribuição de campanhas, compartilhamento de dados e audiências, gestão de dados e visão da jornada. Desde walled gardens formados pelas grandes plataformas de tecnologia, conteúdos e anúncios, até plataformas com modelos diversificados e que foram incorporando features e mecanismos para coleta e colaboração de dados de forma compartilhada (como AdTechs, por exemplo), ou mesmo pure-players, que são provedores que já nasceram especificamente com este propósito.
Quanto? É importante considerar o custo de contratação da plataforma ou da tecnologia, custo de implementação (que pode ser interno ou externo através de um terceiro), além de custo de capacitação dos times e operação/manutenção. Por outro lado, é essencial compreender essa solução também como oportunidade de receita – tanto a possibilidade de criar grandes marketplaces de verticais, quanto de monetização de dados e audiências através da rentabilização de espaços publicitários. Isso destrava uma série de oportunidades de monetização e segmentos que estão em alta, como Retail Media. Ou seja, mesmo diante de um cenário desafiador, quem consegue se adaptar e aproveitar as oportunidades que uma gestão de dados inteligente, segura e padronizada pode trazer, desperta novas fontes de receita.
Como? Para iniciar uma jornada de construção de um data clean room, é importante começar levantando casos de uso relevantes e valiosos para o seu negócio, além de identificar e negociar já possíveis parceiros – esses pontos são a chave de sucesso de uma implementação bem-sucedida e que traga retornos monetários para o negócio. A partir daí, comece com uma prova de conceito e trazendo resultados, desenvolva o plano de roll out completo, priorizando a entrega e execução dos casos de uso prioritários. De forma mais específica, a parte de organização dos dados, padronização, capacitação dos profissionais e familiaridade com linguagem de programação (como SQL) para facilitar o manuseio com os dados, são etapas essenciais para garantir bons insumos e uso otimizado.
Quando? De acordo com a Gartner, 80% dos anunciantes com investimento de mídia de $1bilhão ou mais, estarão utilizando data clean rooms até 2023. E uma das previsões do IDC de 2022 é de que até 2024, 65% das 2.000 maiores companhias irão formar parcerias relacionadas a compartilhamento de dados com stakeholders através de data clean rooms aumentando sua interdependências mas também cuidando da privacidade e segurança de dados dos usuários. Ou seja, o momento é propício para começar o movimento e alguns testes apesar de algumas restrições e desafios que ainda existem – a colaboração entre o mercado e a padronização ainda é uma limitação latente e justamente por isso quanto mais companhias começarem a adoção, mais alternativas e evoluções são aceleradas para aprimorar as soluções.
Onde? Áreas de marketing, dados, inteligência e tecnologia costumam ser as áreas patrocinadoras e líderes de iniciativas e soluções como essa, tanto pela exigência técnica quanto pelas oportunidades de negócio. E falando de segmentos, todos precisarão se adaptar e encontrar alternativas para o fim dos cookies de terceiros, mas eu destacaria aqui algumas indústrias que claramente já podem se beneficiar de oportunidades que o uso de data clean room pode trazer: CPG (bens de consumo) passando a ter visibilidade mais completa da jornada de compra, principalmente em parcerias com varejistas, que seriam também grandes beneficiários dessa solução com possibilidades concretas de monetização dos dados, além de publishers e players de conteúdo aprimorando a relação de parceria e cooperação com os anunciantes.
Fato é que estamos em um caminho sem volta – o cenário de constante mudança acompanhado de incertezas vai continuar, e é nosso papel se adaptar e se atualizar, e quem sabe encontrar novas oportunidades. O que muitos ainda não entenderam é que continuar a trabalhar e atuar com dados da mesma forma que sempre fizemos não é uma opção: o mercado mudou e, mais do que isso, o consumidor se transformou e vem se transformando. Já passamos das fases de estagnação e é imprescindível que além das discussões e falas, o mercado e a indústria de fato partam para ação a partir da colaboração, do envolvimento, do compartilhamento para construirmos juntos uma nova realidade de dados mais segura, colaborativa, completa e assertiva.
* Fontes: McKinsey, 4/12/21; IAB and Deighton Associates, 2/10/20
Autora: Mônica Fukumoto, Business Analytics Manager na DP6.