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Mulheres do Digital – A urgência de incluir a deficiência nos estudos sobre representatividade e gênero

Mulheres do Digital – A urgência de incluir a deficiência nos estudos sobre representatividade e gênero

Toda mulher já se sentiu frustrada ou atravessada por alguma falta de acolhimento. Por não ter sido considerada, por não ter sido respeitada, por não ter sido consultada, por não ter sido ouvida, por não ter sido reconhecida como um ser de direito, que tem opinião, que tem vez e voz.

Mulheres vivenciam isso todos os dias, mas mulheres com deficiência muitas vezes carregam o peso do capacitismo (preconceito relacionado à deficiência) simultaneamente com os desafios diários que toda mulher passa no âmbito familiar, profissional, particular ou público. É preciso reconhecer que as características de gênero e deficiência não se anulam, muito pelo contrário, coexistem. E essas características precisam ser levadas em consideração no desenvolvimento de produtos, conteúdos e campanhas. 

Não só por uma questão de representatividade e construção de uma imagem mais diversa e real da sociedade, mas também pela garantia de acesso, pelo direito do consumidor e, consequentemente, até o aumento do público-alvo para marcas que, de fato, investirem em uma comunicação inclusiva.

 

O que significa 1%? 

Se o mercado sofre com a falta de dados sobre barreiras de acessibilidade e falta de representatividade é porque esse recorte, na maioria das vezes, não está no briefing e é preciso URGENTEMENTE mudar isso, pois os poucos números que temos já são mais do que alarmantes. 

Segundo a Pesquisa da Todxs – um estudo desenvolvido pela ONU Mulheres e pela Heads Propaganda, viabilizado pela Aliança Sem Estereótipos (movimento que visa conscientizar agências e anunciantes sobre a importância de eliminar os estereótipos nas campanhas publicitárias) -, as pessoas com deficiência encontram apenas 0,8% de representatividade. 

O Movimento Web para Todos, em ação conjunta com a BigData Corp, avaliou e identificou que, dos 14 milhões de sites brasileiros ativos, menos de 1% passou nos testes de acessibilidade. No caso dos sites governamentais, esse percentual cai para 0,34%. O estudo também contou com o apoio técnico do Ceweb.br (Centro de Estudos sobre Tecnologias Web do NIC.br). 

Uma mudança social depende, sim, de diversos atores e, nesse caso, a indústria de comunicação tem a responsabilidade e o poder de mudar esse cenário de forma mais rápida, correta e criativa, mas é preciso envolver profissionais especializados para não cair no discurso vazio.


Relação Ganha-Ganha-Ganha 

A partir do momento em que a acessibilidade e inclusão são contempladas desde a concepção de um projeto, o resultado será positivo para todos os envolvidos. A marca terá uma comunicação mais acessível, as empresas envolvidas terão mais contato com processos e poderão capacitar suas equipes, pessoas com deficiência se verão representadas de forma genuína – cenário que pode impactar em decisões de compra e hábitos de consumo. 

Um exemplo desse ecossistema de vantagens é o case do filme com audiodescrição aberta do Burger King, que foi um grande marco para o movimento de pessoas com deficiência e teve um impacto por conta de seu formato e processo: 

O fato de ter uma pessoa cega na propaganda do Burguer King foi um divisor de águas tanto para a equipe que participou da produção como para a própria comunidade de pessoas cegas. Ter alguém com o mesmo lugar de fala sendo representado em uma propaganda demonstra o quanto é importante ter uma marca mostrando a realidade diversa, de fato.” Luciana Oliveira, integrante da equipe da Sondery e pessoa com deficiência visual. 

 

Quanto mais dados, mais mudança 

Então convido vocês a usar esse mês de reflexão para pensarmos na cultura de monitoramento, KPIs, pesquisas, relatórios e quais lacunas ainda não estão sendo preenchidas. Quais características não estão sendo consideradas, pense nas pessoas com deficiência como parte do seu público, como integrante da sua equipe, como alguém que vai consumir seu conteúdo, mas só poderá fazer isso se sua empresa incluir acessibilidade como um entregável de projeto, especialmente se esse projeto for uma pesquisa de mercado. Pois quanto mais informações tivermos, mais poderemos agir sobre elas e construir uma comunicação cada vez mais inclusiva de verdade. 

Autora: Ana Clara Schneider, fundadora da Sondery Acessibilidade Criativa